Reflexões Sobre Polarização e Debate Público
O filósofo e pesquisador Wilson Gomes, professor titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA), destaca a importância da sutileza em seu pensamento. Embora se identifique como progressista, não hesita em criticar contradições dentro de seu próprio espectro político. Nos últimos anos, Gomes tem se dedicado a analisar um dos principais efeitos da polarização política contemporânea: o radicalismo e a intolerância ao contraditório.
Em seu livro mais recente, “A Tirania da Virtude”, ele aborda a política identitária, que considera uma abordagem autoritária. Em entrevista, Gomes discute a cultura do cancelamento e a regulamentação das redes sociais, temas que têm ganhado destaque no debate público.
Para Gomes, o pensamento dogmático e a falta de disposição para ouvir outras ideias empobrecem o debate democrático. “A democracia não avança quando as posições se tornam extremas”, afirma, acrescentando que a fragmentação da sociedade em grupos fechados, com regras rígidas de lealdade, torna as discussões hostis.
Em um momento político em que nenhum lado possui uma maioria clara, Gomes menciona que uma pesquisa recente revelou que 40% da população acredita que a prisão de Bolsonaro foi injusta. “Essa é uma realidade alarmante”, aponta. Com tantos argumentos que sustentam a prisão, a persistência desse percentual reflete uma resistência ao diálogo.
A Voz dos Grupos Minoritários
Um ponto interessante levantado por Gomes é que grupos minoritários, embora socialmente pequenos, possuem uma forte capacidade de vocalizar suas opiniões e influenciar a agenda pública. Ele ressalta que, apesar de partidos como o PSOL terem bancadas pequenas no Congresso, sua presença no debate é marcante, o que pode gerar uma percepção distorcida da realidade política.
Esse fenômeno ajuda a explicar por que, mesmo com um desgaste visível da polarização, projetos de centro enfrentam dificuldades para ganhar tração. Gomes explica que a polarização ocorre quando as vozes extremas se tornam mais proeminentes, enquanto o centro desaparece. “Fica mais difícil para um candidato de centro se eleger, pois há uma carência de eleitores que se identifiquem com essa posição”, explica.
Ele também destaca a polarização afetiva, onde regras grupais de lealdade contribuem para a resistência à inclusão de pautas que dialoguem com o outro lado. “A transformação de divergências em intolerâncias é um grande desafio”, enfatiza.
O Problema do Cancelamento
Quando o tema do cancelamento surge, Gomes não hesita em afirmar que essa prática é uma forma de autoritarismo. Ele afirma: “Não estamos cancelando apenas opiniões, mas sim pessoas. O resultado pode ser devastador, levando a perdas significativas como emprego e relacionamentos”. Essa dinâmica, segundo ele, representa uma forma sádica de incapacitar aqueles que divergem em suas opiniões.
Gomes menciona um caso emblemático de uma deputada que enfrentou represálias por sua identidade de gênero, sublinhando a fragilidade das discussões contemporâneas. Ele argumenta que a solução para as divergências não pode ser a judicialização de problemas sociais.
A Necessidade de Regulação das Redes Sociais
Ao discutir a regulação das redes sociais, Gomes observa que essa questão é vista por muitos como uma tentativa de silenciar vozes. Para ele, legislar sobre esses temas é uma tarefa complexa, especialmente em um ambiente onde a extrema direita possui maior representação. Segundo ele, seria mais produtivo focar em pautas consensuais, como a proteção de crianças e adolescentes e o combate à desinformação.
Portanto, a reflexão de Wilson Gomes sobre a cultura do cancelamento e a polarização política nos convida a repensar a forma como nos comunicamos e como, muitas vezes, nos isolamos em nossas bolhas. A busca por um diálogo mais aberto e respeitoso é essencial para a saúde da democracia e para o fortalecimento das relações sociais.
